Emoção, razão e números
Publicado em 03/04/2018 , por Marcia Dessen
Será que nosso comportamento em relação ao consumo, a prática ou não de planejamento financeiro e o nível de conhecimento da matemática têm alguma coisa em comum? Pode apostar que sim.
O nível de endividamento do brasileiro é elevado; a proficiência em matemática, baixa. Duas constatações comprovadas por inúmeras pesquisas. Será que uma coisa tem a ver com a outra? Será que o baixo conhecimento da matemática explica o fato de muitos brasileiros não conseguirem pagar suas dívidas?
Pesquisas recentes indicam que sim. E fiquei pensando se a pouca intimidade com a matemática é capaz de explicar, isoladamente, o alto nível de endividamento do brasileiro. Embora seja um ingrediente importante, estou convencida de que não.
COMPORTAMENTO
Tudo começa pelo comportamento, como as pessoas se relacionam com o dinheiro, seus hábitos de consumo. Alguns compram por impulso, outros, para satisfazer necessidades emocionais. Tudo pago com o cartão de crédito, o facilitador que viabiliza a compra. Assim começa uma história que não vai acabar bem.
O consumo abusivo, diferentemente de outras dependências, como o álcool e o cigarro, é socialmente aceito, embora recriminado. Há casos extremos, infelizmente não raros, diagnosticados como doença, a oniomania, caracterizada pelo vício de comprar ou gastar dinheiro, impulso incontrolável, mesmo quando a situação já é de endividamento.
PLANEJAMENTO
Muitos não se identificam com o comportamento de consumo abusivo, só gastam com itens necessários, mas acumulam dívidas que não conseguem pagar. Gastar mais do que ganha é um erro muito frequente e, para fechar a conta no fim do mês, lançam mão do crédito rotativo, seja parcelando a fatura do cartão, seja usando o limite do cheque especial.
O erro pode ser evitado com planejamento, controle de gastos, estabelecimento de limites. Listar todas as despesas, priorizar o que é necessário, se pagar em primeiro lugar para realizar os sonhos, os projetos de vida. Aprender a dizer "não" para si mesmo, para a família, quando não for financeiramente possível atender aos desejos.
Pessoas que começaram a controlar despesas relatam surpresa com o montante de gastos, que imaginavam ser bem menor. Mais que os números em si, o controle revela para onde está indo o dinheiro que falta para coisas importantes.
O controle precisa ser feito. A melhor forma? Do jeito que funcionar para você. Pode ser uma planilha eletrônica, um caderno, um aplicativo. Anotadas todo dia, uma vez por semana, uma vez por mês, não importa, desde que você saiba quanto gastou, com que gastou, quais foram suas escolhas. E avalie se pode melhorar. Quando você perceber o benefício desse planejamento, vai fazer automaticamente, com gosto, uma nova e boa rotina na sua vida.
MATEMÁTICA
Finalmente, a matemática. Vimos que a parte comportamental, seja pelo consumo exagerado, seja pela falta de planejamento, explica boa parte do desfecho infeliz das histórias que acabam em endividamento. Mas onde a matemática entra?
O controle das despesas pode ser feito de forma muito simples, iniciando com o crédito do salário e subtraindo cada despesa planejada. Quando o dinheiro acabar, novas despesas devem ser eliminadas ou adiadas. Continuar gastando quando o saldo for zero significa que você está gastando um dinheiro que não te pertence. Acaba de contrair uma dívida e pagará juros por ela.
Esse é o X da questão, os juros da dívida. A taxa das operações de crédito é expressa em percentual, e acho que é aí que a falta de conhecimento da matemática faz diferença. Não pelo endividamento em si, mas pelo uso da linha de crédito mais cara do mercado, o rotativo.
Os juros podem variar de 2,5% ao mês, no consignado, a 13%, no cheque especial. Qual será o saldo devedor ao fim de um ano, de um inocente empréstimo de R$ 3.000? No consignado, R$ 4.000; no cheque especial, impagáveis R$ 13.000! Fica fácil entender por que o devedor paga, paga e não se livra da dívida.
O tripé controle emocional, planejamento financeiro e um pouco de matemática forma uma alia
Fonte: Folha Online - 02/04/2018
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